O terror imagético de Hitchcock.
Este diretor não é apenas um criador, mas um homem de suma importância, o qual fora aclamado por cineastas franceses da Nouvelle Vague (daí o nascimento de um dos debates mais famosos sobre e do cinema, que primeiro fora publicado no Cahiers du Cinéma para, em 1967, se tornar um livro de entrevistas “Hitchcock/Truffaut: Entrevistas”,) e que, há mais de 60 anos, tem as suas obras consideradas como referenciais para a linguagem cinematográfica e, também por este motivo são largamente reproduzidas por novos realizadores dos mais diversos gêneros fílmicos. Partindo desta breve apresentação, tenho à frente como tarefa aterrorizante discorrer sobre uma das suas maiores obras primas.
Mais que um desafio, falar sobre Psicose (Psycho, EUA, 1960) é uma peregrinação na teoria, no cinema e nos quilômetros de textos, artigos e opiniões que foram criados e versados sobre este filme no longo dos seus 49 anos de existência. Não é por acaso que Psycho é considerado um dos maiores thrillers de toda história do cinematógrafo, já que ele foi o mais copiado e seus símbolos são referências que perduram nos vários filmes do gênero ao longo dos anos. Quantos lançamentos e longa-metragem terminados depois de 1960 tiveram faca com arma mortífera e quantas são as repetidas cenas de mocinhas distraídas tomando seu sexy banho que tem, depois de observados, seus contornos friamente esfaqueados, sendo assim assassinada?
Como estratégia de marketing e uma maneira de prender os espectadores a todos os detalhes da trama, posters com Hitchcock anunciavam o filme, proibindo os espectadores que entrassem na seção depois que ela já estivesse começado. Esta estratégia foi pensada já que ele queria que a platéia se intrigasse com aquela personagem principal (Janet Leigh), uma secretária comum, com aflições comuns, mas que cometeria um grave delito. Prestes a se desfazer do erro, facadas lhe tiram os sentidos e o arrependimento... Isto significa dizer que, antes de criar amor ou ódio pela personagem, em menos de 50 minutos ela foi abrupta e inesperadamente extinta das telonas, sem escatologias. O sangue e as vísceras foram trocados pelos mecanismos fílmicos de contar a história imageticamente. A montagem da cena que é a mais importante do filme (Marion Crane sendo morta a facadas na banheira) é complexa e, apesar de extremamente clipada, misteriosa. Em 45 segundos de filme, que são compreendidos entre o voyeurismo de Norman Bates (Anthony Perkins) e a execução de Marion (Janet Leigh), o diretor utilizou mais de 70 posições de câmeras diferentes, 70 maneiras de ver a senhorita Crane, seu sangue descendo pelo ralo e seu olho morto. Além disso, a fotografia a qual se expressa através de close ups, plongées e desfoques reforçavam a tensão que é ritmada pela obra musical de Bernard Herrmann.
Outra assinatura de Hitchcock que fora grande responsável pela imortalização deste masterpiece foi o seu trabalho de câmera com enquadramentos econômicos, mas expressivos. Em entrevista a Truffaut, o cineasta afirma que ele utiliza a “fabricação de imagens” a seu favor para que consiga expressar o máximo de realismo para os espectadores, sem necessariamente “sujar suas mãos com isso”. Este é o fatídico caso da cena em que Norman encontra a moça morta em seu banheiro. O que Hitchcock dá ao espectador? O mínimo: manchas de sangue e um corpo caído (do qual só os pés são enquadrados). O resto da cena a própria platéia está imbuída de preencher, na sua cabeça ou pesadelos.
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