terça-feira, dezembro 01, 2009

O terror imagético de Hitchcock.

Alfred Hitchcock é um guru cinematográfico. Cresceu profissionalmente trabalhando com grandiosos diretores, como F. W. Murnau e sua cabeça, desde criança, sempre fora tomada pela literatura. Seu perfeccionismo é facilmente diagnosticado nas suas películas, cujas cenas eram ampla e exaustivamente estudadas e testadas (através de story boards, ensaios e retakes) até que tudo ficasse imageticamente e hitchcockianamente comunicável, apreciável e impressionante. Testar técnicas, causar dúvidas, pânico e intriga no público era seu hobby e dever favoritos.
Este diretor não é apenas um criador, mas um homem de suma importância, o qual fora aclamado por cineastas franceses da Nouvelle Vague (daí o nascimento de um dos debates mais famosos sobre e do cinema, que primeiro fora publicado no Cahiers du Cinéma para, em 1967, se tornar um livro de entrevistas “Hitchcock/Truffaut: Entrevistas”,) e que, há mais de 60 anos, tem as suas obras consideradas como referenciais para a linguagem cinematográfica e, também por este motivo são largamente reproduzidas por novos realizadores dos mais diversos gêneros fílmicos. Partindo desta breve apresentação, tenho à frente como tarefa aterrorizante discorrer sobre uma das suas maiores obras primas.
Mais que um desafio, falar sobre Psicose (Psycho, EUA, 1960) é uma peregrinação na teoria, no cinema e nos quilômetros de textos, artigos e opiniões que foram criados e versados sobre este filme no longo dos seus 49 anos de existência. Não é por acaso que Psycho é considerado um dos maiores thrillers de toda história do cinematógrafo, já que ele foi o mais copiado e seus símbolos são referências que perduram nos vários filmes do gênero ao longo dos anos. Quantos lançamentos e longa-metragem terminados depois de 1960 tiveram faca com arma mortífera e quantas são as repetidas cenas de mocinhas distraídas tomando seu sexy banho que tem, depois de observados, seus contornos friamente esfaqueados, sendo assim assassinada?
Neste filme, feito com um dos menores orçamentos já utilizados pelo diretor, Hitchcock ousou em experimentações. Ele estava decidido a construir e instaurar o horror, medo e aflição na cabeça do espectador, eliminando excessos de violência na tela. Para isso, o diretor faz uso de mecanismos que envolvem desde a divulgação do seu longa-metragem, à fotografia, da música à montagem. Estas técnicas foram sabiamente utilizadas para criar a tensão.

Como estratégia de marketing e uma maneira de prender os espectadores a todos os detalhes da trama, posters com Hitchcock anunciavam o filme, proibindo os espectadores que entrassem na seção depois que ela já estivesse começado. Esta estratégia foi pensada já que ele queria que a platéia se intrigasse com aquela personagem principal (Janet Leigh), uma secretária comum, com aflições comuns, mas que cometeria um grave delito. Prestes a se desfazer do erro, facadas lhe tiram os sentidos e o arrependimento... Isto significa dizer que, antes de criar amor ou ódio pela personagem, em menos de 50 minutos ela foi abrupta e inesperadamente extinta das telonas, sem escatologias. O sangue e as vísceras foram trocados pelos mecanismos fílmicos de contar a história imageticamente. A montagem da cena que é a mais importante do filme (Marion Crane sendo morta a facadas na banheira) é complexa e, apesar de extremamente clipada, misteriosa. Em 45 segundos de filme, que são compreendidos entre o voyeurismo de Norman Bates (Anthony Perkins) e a execução de Marion (Janet Leigh), o diretor utilizou mais de 70 posições de câmeras diferentes, 70 maneiras de ver a senhorita Crane, seu sangue descendo pelo ralo e seu olho morto. Além disso, a fotografia a qual se expressa através de close ups, plongées e desfoques reforçavam a tensão que é ritmada pela obra musical de Bernard Herrmann.
Outra assinatura de Hitchcock que fora grande responsável pela imortalização deste masterpiece foi o seu trabalho de câmera com enquadramentos econômicos, mas expressivos. Em entrevista a Truffaut, o cineasta afirma que ele utiliza a “fabricação de imagens” a seu favor para que consiga expressar o máximo de realismo para os espectadores, sem necessariamente “sujar suas mãos com isso”. Este é o fatídico caso da cena em que Norman encontra a moça morta em seu banheiro. O que Hitchcock dá ao espectador? O mínimo: manchas de sangue e um corpo caído (do qual só os pés são enquadrados). O resto da cena a própria platéia está imbuída de preencher, na sua cabeça ou pesadelos.


Por Emilly Dias em 12/05/2009

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