sexta-feira, janeiro 27, 2006

Os passistas


Estávamos, numa calorosa noite de verão, dançando embriagados – de paixão, alegria e muita sedução.
Eu não podia – e também não conseguia – não olhar o teu semblante.
Desejava-te.
Sentia o gosto do teu perfume e a leveza da tua aura.
Aquele sorriso, que encanto...
Não me contive.
O impulso da minha atitude foi tomar-te nos meus braços e envolver teu corpo com o meu. Apaixonado, sussurrei nos teus ouvidos um pedido:
- Vem, que eu vou pousar a mão no teu quadril. Multiplicar-te os pés por muitos mil...
Segurando serenamente teu rosto, inclinei-o para cima, em direção à moradia escura das estrelas, dizendo:
-Fita o céu.
Aquele momento era demasiadamente mágico para mim.
Voluptuosamente rodavas em minha frente, mexendo cada parte deste gracioso corpo, envolvendo-me na tua dança. Inesperadamente, afastava-se de mim dizendo que paixão era um pressuposto para dor.
Indignado argumentei:
- A dor define nossa vida toda, é certo, mas podemos amenizar seus efeitos, fazendo a nossa história, evitando deslizes e aprendendo com o convívio. Os rumos, por nós trilhados, terão passos que lançarão moda por todo e qualquer local por onde passarmos. Negar experiências, por medo da dor, é viver pela metade.
Tu, no entanto, permaneceste onde estavas. No samba. Na dança. Na provocação.
O que não esperavas, porém, era amar a mim em retorno.
E amavas.
Finalmente unimo-nos.
Dois mulatos sorrindo em retratos que a vida imprimia de nós.
E quantos momentos...!
Retornamos aos sambas. Revelar-nos-íamos no Carnaval, caso desbotássemos os outros. O amor cantava por nós, tornando este evento não mais tão prioritário.
Sugiro a ti, minha companheira, que permitamos ao Deus do tempo que nos roube e que, em adição, entreguemo-nos mutuamente à beleza total, vamos?!
Casamo-nos.
Viramos, ao lado de touros, sol, beleza triunfante e unicidade, cartão postal de Madrid, Rio de Janeiro, Salvador e Roma, respectivamente.
Doravante fazem parte de nós lugares, conhecimento vigor sentimental e lua-de-mel permanente.
Tomado por todo sentimento que não conseguia conter em mim, declarei:
- Amor, onde quer que estejamos juntos, multiplicar-se-ão assuntos de mãos e pés e desvãos do ser.
E foi desta maneira que perpetuamos a nossa história e nosso amor.
Emilly dias

Caetano, obrigada. Você é uma obra prima!
A obra da obra:
Vem,
Eu vou pousar a mão no teu quadril
Multiplicar-te os pés por muitos mil
Fita o céu,
Roda:
A dor
Define nossa vida toda
Mas estes passos lançam moda
E dirão ao mundo por onde ir.
Ás vezes tu te voltas para mim
Na dança, sem te dares conta enfim
Que também
Amas
Mas, ah!
Somos apenas dois mulatos
Fazendo poses nos retratos
Que a luz imprimiu de nós.
Se desbotássemos, outros revelar-nos-íamos no Carnaval.
Roubemo-nos ao Deus Tempo e nos demos de graça “a beleza total, vem.
Nós,
Cartão Postal com touros em Madri,
O Corcovado e o Redentor daqui,
Salvador,
Roma
Amor,
Onde quer que estejamos juntos
Multiplicar-se-ão assuntos de mãos e pés
E desvãos do ser.

A ilustração foi retirada do site:
http://www.leroyneiman.com/merchant.ihtml?pid=63&step=4